POSIÇÃO DA AGU DIANTE DO STF - M. GRACE M MENDONÇA
Por: Carlos Alves
Presidente da anapffoficial - ANAPFF
01 de março de 2017
SÍNTESE ELABORADA PELA AGU NOS AUTOS DA ADI 4708 (manifestação):
A visão da AGU Exma ministra Grace Mendonça, que direciona sua manifestação aos substituídos processuais que exerciam atividades de polícia de estado, na rfffsa.
Posteriormente, o Ministro Luiz Fux solicitou, nos termos do rito previsto pelo artigo 10 da Lei nO 9.868/1999, a prestação de informações pelas autoridades requeridas, bem como determinou a oitiva do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República. "Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também. ao seguinte: A investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;" Em atendimento à solicitação, a Presidência da República alegou que o autor não demonstrara, satisfatoriamente, a presença dos requisitos necessários à concessão da medida cautelar pleiteada. Sustentou, ademais, a constitucionalidade da norma hostilizada, argumentando que o dispositivo em exame não autoriza o enquadramento dos profissionais de segurança do grupo Rede em carreira do serviço público, mas possibilita, apenas, que tais profissionais sejam abrigados em departamento específico do Ministério da Justiça. Em sua manifestação, a Câmara dos Deputados informou que o processo legislativo que dera origem à lei impugnada respeitara os mais estritos trâmites constitucionais e regimentais inerentes à espécie.
O então Advogado-Geral da União manifestou-se pela ausência dos pressupostos necessários para a concessão da medida liminar pleiteada. Sustentou que a emenda parlamentar que originou o dispositivo atacado observara o requisito da pertinência temática, bem como respeitara a vedação ao aumento de despesa em projeto de lei da iniciativa do Presidente da República. Alegou, ainda, que o § 8° do artigo 29 da Lei n° 10.683/2003 não contraria o disposto no artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, considerando que a situação jurídica dos agentes de segurança das estradas de ferro constitui exceção legítima à regra da acessibilidade a cargos e empregos públicos pela via do concurso público. Destacou, por fim, que não existiria nenhum risco de impacto financeiro a ser suportado pelo Poder Público em razão da eficácia da norma atacada. De sua vez, o Procurador-Geral da República opinou pela concessão da medida liminar pleiteada na petição inicial. Sustentou, inicialmente, que haveria vício de inconstitucionalidade formal, sob o argumento de que a emenda parlamentar que dera origem à norma impugnada não teria relação de pertinência temática com o texto originário da Medida Provisória n° 103, de 1° de janeiro de 2003, convertida posteriormente na Lei n° 10.683/2003. Alegou, também, violação ao artigo 37, inciso lI, da Lei Maior, na medida em que a norma sob invectiva teria previsto, a um só tempo, o acesso a cargo público sem a prévia aprovação em concurso e a conversão do regime celetista em estatutário em desconformidade com a Constituição Federal.
Em petição protocolizada no dia 12 de agosto de 2018, a então Advogada Geral da União requereu a preferência no julgamento do pedido liminar. Para tanto, informou que as tratativas referentes à criação da carreira de policial ferroviário federal, com a absorção dos profissionais de segurança pública ferroviária do Grupo Rede, foram sobrestadas pela Consultoria-Geral da União até que essa Suprema Corte decida acerca do pedido liminar formulado na presente ação direta (Nota nO 06/20 13/MCA/CGU/AGU). Relator adotou o rito previsto no artigo 12 da Lei n° 9.868/1999, solicitando informações definitivas às autoridades requeridas, além da oitiva da Advogada Geral da União e do Procurador-Geral da República. Em suas informações, a Presidência da República defendeu a constitucionalidade do ato impugnado, reportando-se aos termos da manifestação anteriormente apresentada na presente ação direta. O Congresso Nacional manifestou-se pela constitucionalidade da norma atacada. Destacou a idoneidade do processo legislativo que culminara na edição do dispositivo sob invectiva. Afirmou, ademais, que a norma atacada está em consonância com o disposto no artigo 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, uma vez que "(...) as atribuições desempenhadas pelos empregados públicos eram semelhantes às desempenhadas pelos servidores públicos do Departamento de Polícia Ferroviária Federal, ou seja, o policiamento ostensivo ferroviário, o que justificou o reenquadramento dos mesmos (...)" (fl. 10 das informações prestadas).
MANIFESTAÇÃO DA AGU CONFIRMANDO TESE DA ANAPFF:
Na espécie, observa-se que a matéria tratada no dispositivo impugnado, incluído por meio de emenda parlamentar, guarda pertinência com a proposição elaborada inicialmente pelo Chefe do Poder Executivo. Isso porque a redação originária do projeto de lei 6 já previa que a estrutura básica do Ministério da Justiça seria integrada pelo Departamento de Polícia Ferroviária Federal. Por sua vez, a norma hostilizada determinou o aproveitamento de ''profissionais da Segurança Pública Ferroviária oriundos do grupo Rede" no referido departamento. Destarte, constata-se que o artigo sob invectiva cingiu-se a definir parcela dos agentes que integram o Departamento de Polícia Ferroviária Federal, órgão, esse, cuja existência já estava prevista na redação originária do projeto de Relativo à conversão da Medida Provisória n° 527, de 18 de março de 2011, na Lei n° 12.462, de 04 de agosto de 2011. lei de conversão derivado da iniciativa do Presidente da República. Portanto, tem-se evidenciado o indispensável vínculo de pertinência temática na espécie. Como se sabe, a criação de órgãos públicos pressupõe, invariavelmente, a admissão do pessoal necessário ao desempenho das respectivas competências. De fato, órgãos públicos “são unidades abstratas que sintetizam os vários círculos de atribuições do Estado (..). Então, para que tais atribuições se concretizem e ingressem no mundo natural é necessário o concurso de seres físicos, prepostos à condição de agentes”? Assim, ao determinar o aproveitamento de profissionais do denominado grupo Rede no Departamento de Polícia Ferroviária Federal, a disposição hostilizada não resultou em geração de nova despesa pública, haja vista que os gastos com pessoal decorrem, diretamente, da criação do órgão cujo quadro será preenchido (na espécie, o Departamento de Polícia Ferroviária Federal, que já era previsto pelo artigo 29, inciso XIV, da Lei nO 10.683/2003).
Tanto é assim que a Constituição, embora permita ao Presidente da República dispor, mediante decreto, sobre a organização da administração federal, reserva a criação de órgãos públicos à lei em sentido formal, conforme se extrai dos MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 21 a ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. artigos 61, § l°, inciso 11, alínea “e”; e 84, inciso VI, alínea "a", ambos da Carta Maior. Ademais, ressalte-se que, mesmo antes de sua integração ao Departamento de Polícia Ferroviária Federal, os agentes contemplados pela disposição vergastada já eram, na prática, remunerados pelos cofres públicos federais. Com efeito, os empregados da Rede Ferroviária Federal (RFFSA) foram transferidos, quando de sua extinção pela Lei n° 11.483, de 31 de maio de 2007, à VALEC – Engenharia, Construções e Ferrovias S.A., que, nos termos do artigo 8° da Lei n° 11.772, de 17 de setembro de 2008 1°, reveste-se da natureza de empresa pública federal. Já a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) e a Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre (Trensurb) caracterizam-se como sociedades de economia mista controladas pela União, que detém, respectivamente, 100%11 e 99,8812%12 das ações que compõem o capital social dessas empresas. De modo semelhante, também constitui exceção ao princípio do concurso público o disposto pelo artigo 19, caput, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que, no intuito de adequar a situação dos servidores da administração direta, autárquica e das fundações públicas à ordem IJ Op. cit., p. 338. 14 AIJI n° 2566 Me, Relator: Ministro Sydney Sanches, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Julgamento em 22/05/2002, Publicação em 27/02/2004. Constitucional inaugurada em 1988, conferiu estabilidade no serviço público a servidores que não haviam sido admitidos por concurso público. Confira-se a redação da referida regra transitória: Art. 19. Os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em exercício na data da promulgação da Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e que não tenham sido admitidos na forma regulada no art. 37, da Constituição, são considerados estáveis no serviço público. Nesse contexto e diante do disposto pelo texto originário do artigo 39 da Carta da República 15, que impôs a adoção de regime jurídico único de pessoal, editou-se a Lei n° 8.112, de 1] de dezembro de 1990, cujo artigo 243 possibilitou o enquadramento, no regime estatutário, de servidores dos Poderes da União, dos ex-Territórios, das autarquias e das fundações públicas, admitidos sob a égide da Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-Lei nO 5.452, de 1° de maio de 1943), anteriormente à vigência da Constituição Federal.
Eis a redação do dispositivo legal referido, in verbis: Art. 243. Ficam submetidos ao regime jurídico instituído por esta Lei, na qualidade de servidores públicos, os servidores dos Poderes da União, dos ex-Territórios, das autarquias, inclusive as em regime especial, e das fundações públicas, regidos pela Lei n° 1.711, de 28 de outubro de 1952 – Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União, ou pela Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei n° 5.452, de 1° de maio de 1943, exceto os contratados por prazo determinado, cujos contratos não poderão ser prorrogados após o vencimento do prazo de prorrogação. § l° Os empregos ocupados pelos servidores incluídos no regime instituído por esta Lei ficam transformados em cargos, na data de sua publicação. Na hipótese em exame, como visto, o dispositivo impugnado determina a integração dos agentes de segurança do Grupo Rede – Rede Ferroviária Federal (RFFSA), Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) e Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre (Trensurb) - nos quadros do Departamento de Polícia Ferroviária Federal do Ministério da Justiça. Denominados pela norma legal vergastada de “profissionais da Segurança Pública Ferroviária oriundos do grupo Rede”, referidos agentes de segurança eram encarregados do patrulhamento ostensivo das ferrovias federais, função, essa, que decorreu da construção da malha ferroviária federal nos moldes previstos pelo Decreto n° 641, de 26 de junho de 1852.
Da mesma forma, o Edital n° 17, de 23 de fevereiro de 1976, da Rede Ferroviária Federal S/A (RFFSA) comprova a admissão de agentes de segurança, por concurso público, para o exercício de atividades de policiamento. As atribuições previstas para os agentes de segurança foram sintetizadas pelo edital de convocação nos seguintes termos 17: 1. Síntese das Atribuições: Executar serviços de policiamento ostensivo, preventivo e repressivo, no âmbito da Ferrovia. Mediante designação administrativa, executar, fiscalizar e/ou coordenar serviços de vigilância, guarda e segurança. Realizar investigações e diligências de natureza policial e executar outras tarefas com vistas a segurança de pessoas, bens valores de Ferrovia, bem como a Segurança Nacional. (Grifou-se). Assim, constata-se que os ''profissionais de segurança do grupo Rede" exerciam o policiamento ostensivo das ferrovias federais, atividade, essa, Documento n° 39 do processo eletrônico. Informação extraída da fi. 09 da petição de Retificação da Inicial de Ação Civil Pública, apresentada nos autos da Ação Civil Pública n° 2006.83.00.006489-2, ajuizada pelo Ministério Público Federal em face da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), perante a Justiça Federal de Pernambuco (documento nO 39 do processo eletrônico). que é da competência da polícia ferroviária federal, segundo o artigo 144, § 3°, da Carta Maior. Confira-se o teor do referido dispositivo constitucional: Art. 144.
A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos Seguintes órgãos: § 3° A polícia ferroviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das ferrovias federais. Nesse sentido, diversamente do sustentado pelo requerente, observa-se que os agentes de segurança referidos pela disposição impugnada desempenhavam atividade típica de Estado, isto é, exerciam atividade de polícia nas estradas de ferro federais, inclusive com a função de evitar a ocorrência de danos à segurança de bens e pessoas. Em outros termos, embora possuíssem, formalmente, vínculo funcional com empresas estatais, os “profissionais da Segurança Pública Ferroviária” exerciam, já em 11 de dezembro de 1990, atividade típica de cargos efetivos da administração pública direta, isto é, o policiamento da malha ferroviária. Assim, diante da natureza das atribuições desempenhadas pelos agentes referidos, constata-se que sua situação jurídica está albergadas pelas disposições do artigo 39, caput, da Constituição, em sua redação originária; do artigo 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, bem como do artigo 243, caput, da Lei n° 8.112/1990, que submeteram ao regime estatutário e conferiram estabilidade no serviço público aos servidores da administração direta, autárquica e das fundações públicas, admitidos sob a égide da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Feitas tais considerações, contata-se que o § 8° do artigo 29 da Lei nº 10.683/2003, incluído pela Lei nO 12.462/2011, não contraria o disposto no artigo 37, inciso 11, da Constituição Federal, uma vez que a situação jurídica dos agentes de segurança das estradas de ferro constitui exceção legítima à regra da acessibilidade a cargos e empregos públicos pela via do concurso público.
DA CONCLUSÃO Ante o exposto, a Advogada-Geral da União manifesta-se pela improcedência do pedido veiculado pelo requerente, devendo ser declarada a constitucionalidade do artigo 29, § 8°, da Lei nO 10.683, de 28 de maio de 2003. Brasília, '1 de março de 2017.
GRACE MARIA DE MENDONÇA - Advogada-Geral da União
Parágrafo Novo
ANAPFF.OFICIAL


